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Legado das Palavras: Na Estante - Resenha - Doutor Sono

Na Estante - Resenha - Doutor Sono

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Trinta e seis anos depois, o escritor Stephen King respondeu a pergunta: o que aconteceu com Danny e Wendy Torrance após os eventos no hotel Overlook? A resposta chegou com um impactante e incrível romance, o Doutor Sono, sequência direta do livro O Iluminado, publicado em 1977. Lançado originalmente em 2013, a sequência chegou ao Brasil em 2014, publicado pela Suma das Letras É King em sua (quase habitual) velha e boa forma. E antes que vocês perguntem, sim, é assustador.
No início do livro seguimos uma linha do tempo. Nela acompanhamos alguns dos acontecimentos mais marcantes da vida de Daniel Anthony Torrance, após sua aterrorizante experiência na história anterior. Quem acreditava que o garotinho meigo e sensível, que crescera perturbado por entidades, se tornaria um adulto exemplar, acaba sendo surpreendido ao vê-lo num estado de degradação à la Jack Torrance.
Herdando os vícios do pai, o que vemos é um sujeito refém do álcool e atormentado, seja pelo passado distante ou mais recente; um homem que vive solitariamente, pulando de cidade em cidade, sem se fixar.
Quando consegue se estabilizar e começar efetivamente a enfrentar o vício, Dan entra em contato com algo ligado diretamente ao seu passado e sua infância. E, faz uma nova amizade, com a carismática Abra Stone – uma garota cujos poderes de iluminação são os maiores já presenciados por Dan. O problema é que os poderosos dons de Abra também atraem os olhares de pessoas malignas e inescrupulosas, entrelaçando, assim, sua vida com a de Dan Torrance. Obrigando seu novo amigo a lutar por todas as coisas boas conquistadas em sua vida atual. E todos a quem aprendeu gostar, incluindo Abra.

O Iluminado é frequentemente (e merecidamente) citado como um dos romances mais assustadores de King, o que, de fato, é. Quando foi anunciado que sairia uma continuação dele, pensei em duas coisas: 1) eu realmente quero saber o depois da história e 2) que seja bom, pelo amor de Deus, que seja bom.
Ambos os pensamentos tiveram respostas que superaram as expectativas iniciais. Continuações são difíceis, ainda mais se tratando de uma das obras-primas do autor. Mas, felizmente, ele teve êxito. Doutor Sono não só é assustador, mas também trabalha elementos dramáticos com imensa maestria. Quanto a escrita, é interessante observar como a narrativa e as ferramentas usadas são idênticas ao do romance interior. Nem parecem ter três décadas de diferença. E isso é algo positivo, você pode entender como se a escrita do autor não tivesse melhorado em nada, mas não, não é isso. Foi importante Doutor Sono manter essa “herança da escrita” de O Iluminado.  
A escrita densa e realística de King continua a mesma. Sempre ótima. Ele sabe dosar as palavras, frases, parágrafos, trabalhar com o suspense e, principalmente, com o sentimento dos leitores. Dentre outros aspectos, já citados, o sempre presente não conte-me, mostre é feito com proficiência.
Não é segredo que Stephen King coloca muito de suas experiências pessoais nas obras em seus livros. Alcoólatras, drogados, experiências de quase morte e, claro, superação. Ou seja, além do clima tenso e supernatural, da crueldade humana (e sobre humana) quase sempre presente em suas obras, e aqui é mantida, ainda em relação ao primeiro livro, podemos explorar diversos outros componentes que constituem a sequência. É o tipo de história que leva o leitor da lama ao chuveiro, em momentos prazerosos de leitura. Há capítulos em que conseguimos odiar e repudiar Danny, mas com habilidade, a narrativa nos faz torcer por ele e sua recuperação – e deixa feliz quando lemos a superação acontecer.
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Danny Torrance é um abismo de profundidade. Conhecemos seus medos, seus desejos; quase choramos com algumas atitudes, sorrimos com outras. Ele se consolida como um dos mais memoráveis personagens criados por King.
E, aqui, abro espaço para Abra Stone. Aquela garotinha inteligente e determinada, movida por bons sentimentos em relação ao mundo, mesmo quando a morte e dor a espreitam. Como já dito, seu poder de iluminação é gigantesco, o que atrai a atenção do Verdadeiro Nó, um dos grupos de vilões mais inescrupulosos já criados pela mente de seu criador.
Liderados por Rose, A Cartola, eles formam uma caravana itinerante, que viaja todos os Estados Unidos, como pessoas ricas, aposentadas e que só desejam curtir o resto da vida na Terra.  O grupo possui vários seguidores, cuja interminável viagem pelo país, é baseada em apenas uma busca: crianças iluminadas.
Eles alimentam-se da essência deixada por elas, após submetê-las a uma cruel sessão de tortura ritualística. As vítimas exalam uma espécie de vapor, tal preciosidade é o que o Verdadeiro Nó busca, é o que os mantém fortes e vivos e imortais. São vampiros implacáveis a caça de sua fonte de juventude.
Se você acha que nada poderia ser mais insano que diversos espíritos presos, através das décadas, dentro de um hotel, querendo a alma de um garoto iluminado: prepare-se.
Quem já leu, sabe o quão alucinante é a criação desses caçadores de iluminados. Já deu pra sacar que Abra e Dan se unirão para detê-los, não é? Pois é.
Há outros ótimos personagens pelo lado do bem. Como o doutor John Dalton ou os pais de Abra. Além deles, cito o velho Billy e Momo, Cocetta, indispensáveis para o enredo. Em contrapartida, cada um dos integrantes do Verdadeiro nos causa repulsa. Estejam reunidos ou sós, todos são odiáveis. Ao ler você descobrirá do que escrevo aqui.

Doutor sono torna-se leitura indispensável do currículo de Stephen King, não apenas por ser uma continuação, mas por espetacular. É difícil dizer qual seria a experiência de leitura, por parte de quem não leu O Iluminado, mas certamente seria incompleta. Digo isso, pois na Nota do Autor, King deixa claro que assistir ao (ótimo) filme dirigido por Stanley Kubrick, não dá bagagem necessária sobre a família Torrance para a leitura de Doutor Sono. E eu concordo.
Por fim, ressalto as muitas referências que o livro faz a outros livros e séries, músicas e filmes, adorados por Stephen King. Assim como o que ele também não gosta.

Leitura mais que recomendada. Parada obrigatória para os fãs do escritor. 
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